segunda-feira, 27 de junho de 2011

160.Negócio Jurídico/Leitura de um Leigo

Negócio jurídico é um ato de vontade (fato jurídico), que deve ser feito segundo uma forma estabelecida por lei (norma jurídica), e cria relações jurídicas entre pessoas (quer físicas quer jurídicas), uma que leva vantagem ou direito (sujeito ativo), outra que sofre desvantagem ou obrigação (sujeito passivo), com vistas a um objeto (o bem pretendido) para satisfação de um interesse.
A Contribuição, que Participante e Patrocinador creditam mensalmente à PREVI, é um negócio jurídico. Ela consiste (fato jurídico) no retirar (debitar) parte do patrimônio da pessoa física (o Participante) e da pessoa jurídica (o Patrocinador), em cumprimento da LC 109 (norma jurídica), e transferir para o patrimônio da PREVI (pessoa jurídica), com a intenção de que esta a faça integrar as reservas do Plano 1 de Benefícios (objeto), que serão consumidas em benefícios previdenciários (o interesse), aposentadoria e pensão. Participante e Patrocinador são sujeitos passivos e a PREVI é o sujeito ativo desse negócio jurídico. Feita essa transferência esse negócio jurídico, a Contribuição, está concluída. É um negócio jurídico perfeito e acabado. A contribuição não mais existe. Ela é passado. Como tudo na existência, a contribuição se gera, é e acaba.
É isso que é economica e juridicamente a Contribuição: transferência de recursos patrimoniais de Participantes e Patrocinador para o patrimônio da PREVI, a fim de constituir reservas para benefícios previdenciários. Antes de ser contribuição (recursos apartados em trânsito de um patrimônio, sujeito passivo, para outro, sujeito ativo), os recursos da contribuição eram outro negócio jurídico (patrimônio de uma pessoa física ou de uma pessoa jurídica) e, depois de ser contribuição, ela se torna outro negócio jurídico (patrimônio de outra pessoa jurídica).
E o que existe agora na Previ?
Existe um patrimônio da PREVI, sociedade civil sem fins lucrativos. Esse é o primeiro aspecto do fato jurídico, do novo negócio jurídico constituído pela PREVI.
O Patrimônio é a totalidade de valores pertencentes a uma pessoa física ou jurídica. O patrimônio da PREVI, segundo se deduz do Houaiss, é tudo aquilo que ela tem o direito legal de possuir, e possuir com exclusividade, de usar, gozar e dispor e de reavê-lo do poder de quem ilegalmente o possua. Isso é coisa bem diferente de Contribuição, não acham?!
O patrimônio, os bens pertencentes a uma pessoa física ou jurídica, está protegido pela Constituição: “é garantido o direito de propriedade.” Esse patrimônio da PREVI é, pois, um negócio jurídico, outro negócio jurídico. Ele só pode ser usado, gozado e manipulado segundo a norma jurídica. A PREVI é o sujeito ativo (tem a vantagem, o direito) e todas as outras pessoas, inclusive o Patrocinador, são sujeitos passivos (tem desvantagem, obrigações). É posse exclusiva da PREVI, a autonomia do proprietário.
A primeira norma jurídica que trata desse patrimônio é a própria Constituição: “O regime de previdência privada, de caráter complementar... será... baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.”
Os Constituintes preocuparam-se em caracterizar juridicamente a parte substancial desse patrimônio: reservas que serão consumidas em benefício previdenciário contratado, e em valor tal que garantam a viabilização da satisfação dessa finalidade.” Reservas para serem consumidas somente em aposentadoria e pensão, no caso da PREVI, portanto. O consumo dessas reservas em qualquer outra finalidade é um benefício (uma vantagem, uma coisa boa) inconstitucional, porque o negócio jurídico estaria sendo desviado do objeto a que foi destinado.
A Constituição deixou para a lei complementar a elaboração da norma jurídica minuciosa, que rege este negócio jurídico, que é o patrimônio da Previdência Complementar, as reservas garantidoras do benefício contratado, como se expressa a Constituição. Essa tarefa foi desempenhada pela LC 109, sobretudo no que nos interessa, do artigo 6º ao artigo 25.
A LC 109 inicia reconhecendo o negócio jurídico criado pela Constituição: cujo núcleo essencial consiste em “reservas que garantam o benefício”, isto é, o benefício contratado.
E ela prossegue: “O regime de previdência complementar é operado por entidades de previdência complementar que têm por objetivo principal instituir e executar planos de benefícios de caráter previdenciário, na forma desta Lei Complementar.”.
Aquele negócio jurídico (patrimônio, reservas) assume as vestes normativas jurídicas de um plano de benefícios de caráter previdenciário (não pode ter outro objeto, senão o objeto constitucional). Seria o legislador vidente? Estaria ele antevendo que se poderia desviar para outro objeto, que os recursos das reservas poderiam tornar-se benefício não previdenciário, coisa boa para outras pessoas que não participantes, que não pessoas físicas, que não legalmente inválidos ou dependes de pessoas falecidas?
E acrescenta: “na forma desta Lei Complementar”. Estaria o legislador antevendo que se poderia alterar o objeto deste negócio jurídico, por instrumentos normativos extralegais? Sábia LC 109: plano de benefícios tem que seguir a forma estabelecida por ela. Os benefícios que não forem previdenciários, portanto, exatamente porque os benefícios previdenciários são que constituem o núcleo essencial do plano de benefícios, essas vantagens não previdenciárias, essas coisas boas, não podem ser acrescentadas aos planos de benefícios. Não se podem gastar recursos de reservas com coisas boas não previdenciárias.
O que é um plano de benefícios?
Benefício, como se viu, é uma vantagem, (e. de acordo com a lei, não integrante do salário), que o empregador oferece ao empregado, movido pelo interesse de manter-lhe o vínculo empregatício e estimular a produtividade. Já o plano de benefícios, em seu núcleo essencial, compreende o conjunto de benefícios que são oferecidos e que podem ser individuais, econômicos e sociais. Entre os sociais destacam-se os benefícios previdenciários. Há uma infinidade de planos de benefícios possíveis, portanto, e as empresas usam de muita flexibilidade na elaboração de seus planos de benefícios.
Um plano de benefício, em geral, além do elenco dos benefícios, a sua parte mais importante, contém a descrição dos benefícios, envolvendo o cálculo do valor do benefício, as condições requeridas para adquiri-los e o prazo de fruição dos benefícios.
Aprecio muito a definição de plano de benefícios existente no site do Ministério da Previdência Social: “o conjunto de direitos e obrigações reunidos num regulamento.” A PREVI apresenta no Regulamento do Plano 1 de Benefícios sua definição de plano de benefícios: “conjunto de regras definidoras de benefícios de caráter previdencial, comum à totalidade dos participantes a ele vinculados, com independência patrimonial, contábil e financeira em relação a quaisquer outros.”
Muito interessante um aspecto ressaltado nessa definição: benefícios de caráter previdencial. Logo, não deveria estar incluído naquele Regulamento o benefício, a coisa boa, que é a partilha da Reserva Especial com o Patrocinador, porque isso é um benefício, uma coisa boa, para o Patrocinador, mas não é de caráter previdencial. É um desvirtuamento do objeto do negócio jurídico, que é o plano de benefício: benefício de caráter previdencial. A Constituição manda que se gastem os recursos das reservas somente com benefícios contratados (só os benefícios previdenciários de aposentadoria e pensão podem ser contratados pela PREVI) e a LC 109 o confirma: “planos de benefícios de caráter previdenciário”.
Segundo o art.8º da LC 109 a única pessoa que pode receber um benefício da PREVI é um participante, pessoa física, que se torna assim participante assistido. A Previ, portanto, não pode consumir recursos das reservas em benefício do Patrocinador, porque ele não é participante, não é pessoa física, nem pode ser muito menos participante assistido. Num Plano de Benefícios o único sujeito ativo do negócio jurídico, que o Plano é, a única pessoa que pode ter vantagem, direito, é o Participante, pessoa física.
Os artigos 9º e 19 são extraordinariamente claros: todas as contribuições (as normais e as extraordinárias) ingressam na PREVI para formar as reservas matemáticas (as principais reservas técnicas), cuja finalidade é serem gastas no pagamento de benefícios previdenciários. Inexiste a menor abertura para se desviarem esses recursos para benefícios outros, como, por exemplo, coisa boa para o Patrocinador.
Nos artigos seguintes, a LC 109 se estende sobre várias minúcias desse plano de benefícios, desse negócio jurídico, como: aplicação financeira dos recursos, inscrição e certificado dos participantes, documentos que devem ser fornecidos aos participantes, e até marketing.
Antes de se estender sobre as minúcias de um plano de benefícios, ela estabelecera a existência de dois tipos de entidades autorizadas a possuírem esse patrimônio, essas reservas para serem consumidas em benefícios previdenciários contratados: EFPC (entidade fechada de previdência complementar) e EAPC (entidade aberta de previdência complementar). Há duas diferenças fundamentais entre essas entidades:
a primeira diferença, o participante da EFPC é empregado da empresa ou servidor público da entidade que a patrocina (patrocinador), ou membro da pessoa jurídica da classe profissional ou social ou setorial que a institui (instituidor); já o da EAPC pode ser qualquer cidadão.
a segunda diferença, a EFPC é uma pessoa jurídica sem fins lucrativos (a PREVI, por exemplo, é uma sociedade civil sem fins lucrativos), enquanto a EAPC é uma sociedade anônima ou uma seguradora do ramo do seguro de vida.
Não me interessa focar aqui, portanto, a EAPC. Vale, porém, salientar que o aspecto de justiça social (igualar pessoas, transferência de recursos de quem tem mais para quem tem menos), é tão importante que a LC 109 exige que o objeto “instituir e executar planos de benefícios de caráter previdenciário, mesmo na EAPC, seja o principal, isto é, mais importante do que o objeto lucro. Para os nossos Constituintes, o bem estar social e a justiça social são valores superiores ao enriquecimento individual. Por isso, a transferência de riqueza na Previdência Social só se dá em mão única: de quem tem renda ou mais renda para quem tem menos, ou nada tem.
Do artigo 12 ao artigo 25, a LC 109 trata minuciosa e unicamente dos planos de benefícios instituídos por EFPC: constituição de patrocinador ou instituidor, benefício proporcional diferido, portabilidade, carência, resgate de contribuições do participante, etc.
O artigo 18 manda que o plano anual de custeio (periodicidade mínima) estabeleça “o nível de contribuição necessário à constituição das reservas garantidoras de benefícios, fundos, provisões e à cobertura das demais despesas, em conformidade com os critérios fixados pelo órgão regulador e fiscalizador.”.
Estamos percebendo a preocupação da Constituição e da Lei concentrada neste aspecto do equilíbrio deste negócio jurídico, reservas garantidoras dos benefícios, estendendo-se até a essas outras obrigações como as despesas com a administração do plano. Mas, o mais importante, o crucial mesmo, o que gera toda a celeuma é precisamente o das reservas garantidoras de benefícios, porque correspondem às mais significativas despesas e as mais importantes, já que são exatamente o objeto desse negócio jurídico, o plano de benefício.
E o artigo 18 se desdobra com reforços a essa característica de garantia, determinando o regime financeiro de capitalização, o equilíbrio financeiro e atuarial, de forma que os recursos do plano de benefícios tenham a exata dimensão de todas as obrigações contraídas.
No artigo 19, a LC 109 foca o negócio jurídico das contribuições (normais e extraordinárias). A Lei já está, em verdade, focando esse fato jurídico que essa veste toda do plano de benefícios trasmudou em negócio jurídico: as reservas garantidoras de benefícios.
Como esse grande depósito de recursos se abastece? Abrindo a torneira da contribuição. O negócio jurídico da contribuição é processo fluido e normalmente ritmado. Abre periódica e eventualmente, e na medida do necessário, já foi dito antes, e com a alta precisão do cálculo atuarial. A contribuição só existe enquanto a torneira se abre. Não existe antes nem depois. E só existe, quando é necessária.
E atente-se muito fixamente para o que nos revela esse artigo 19:
“As contribuições destinadas à constituição de reservas terão como finalidade prover o pagamento de benefícios de caráter previdenciário, observadas as especificidades previstas nesta Lei Complementar.
Todas as contribuições (normais e extraordinárias) só podem ser consumidas em pagamento de benefícios de caráter previdenciário, isto é, com aposentadoria e pensão, no caso do Plano 1 de Benefícios da PREVI. Gastar com reversão de contribuições não pode, porque não é aposentadoria e pensão, não é benefício, coisa boa, de caráter previdenciário. Este artigo da LC 109 o proíbe claramente, como claramente o proíbe, já o vimos, o artigo 202 da Constituição.
E note-se bem a generalidade exibida no caput do artigo 19: reservas. Nos desdobramentos posteriores, a LC 109 falará de reservas matemáticas, reservas de contingência, reserva especial. Mas, aqui, no caput do artigo 19, ela fala de reservas, isto é, qualquer reserva, seja ela matemática, de contingência ou especial,
E até parece que o legislador suspeitava da possibilidade de algum desvirtuamento, porque ainda acrescenta como se estivesse acautelando a Lei: observadas as especificidades previstas nesta Lei Complementar. Isto é, neste particular do objeto deste negócio jurídico, que é o Plano de Benefícios, não se aceitam especificidades outras (como as de Resolução ou Regimento), somente se aceitam as constantes da LC 109.
Chegamos, assim, ao mais importante artigo da LC 109, o artigo 20. Ele se concentra precisamente nesse fato jurídico, as reservas garantidoras de benefícios previdenciários, que a Constituição e as Leis Complemetares 108 e 109 transformaram em negócio jurídico, denominado Plano de Benefícios.
Esse fato jurídico, as reservas garantidoras de benefícios previdenciários, pode consistir de apenas um continente, as reservas matemáticas. A leitura do artigo 20 nos insinua que, abrindo-se a torneira das contribuições, os recursos ingressam nas reservas matemáticas. Que nome sugestivo!
Pelo que prescrevem os artigos 19 e 20, temos então um grande tanque de recursos, as reservas matemáticas, com duas torneiras, a torneira de abastecimento do tanque, a das contribuições, e a torneira de esvaziamento do tanque, a de gastos com benefícios previdenciários. A torneira das contribuições se abre para os sujeitos passivos, os sujeitos de obrigações, participantes e Patrocinador. A torneira dos gastos se abre unicamente para os sujeitos ativos, os sujeitos de direitos, os Participantes. Nada sai desse tanque, já vimos, se não for para gastos com benefícios previdenciários, diz a Constituição e a LC 109. Não se pode abrir essa torneira para o Patrocinador, porque ele é apenas sujeito passivo nesse negócio jurídico que é o Plano 1 de Benefícios da PREVI.
E não pode sair, se não tiver esse objeto, a saber, gastos com benefícios previdenciários, aposentadoria e pensão no caso da PREVI. Por que? Exatamente porque são reservas matemáticas. Nesse tanque só ingressaram contribuições na exata medida dos benefícios a pagar, já o vimos. E isso foi feito, nós também já o vimos, com precisão matemática, a mais alta precisão matemática existente na atual tecnologia da Matemática Financeira, o cálculo atuarial.
A EFPC, já vimos, não se confunde com a EAPC, exatamente nisto, a saber, não existe para produzir superávit, para produzir lucro. Ali, na EFPC, normalmente, só deverão existir as reservas matemáticas, essas que são calculadas com a tecnologia de ponta da Matemática Atuarial.
Acontece, todavia, que nada é mais volátil que o preço, sobretudo o preço nos mercados financeiros e imobiliário. Ora, volátil demais com tendência a alta, ora volátil demais com tendência a baixa. Por isso, essas reservas matemáticas, conquanto calculadas com a máxima precisão possível do cálculo atuarial, elas por vezes transbordam, como também por vezes minguam. Daí a prescrição desse mesmo artigo 20: balanço anual do plano de benefícios, a fim de verificar se de fato está sendo cumprido aquele mandamento do artigo 7º da LC 109: os planos de benefícios deverão apresentar “... solvência, liquidez e equilíbrio econômico-financeiro e atuarial.”
O resultado desse balanço anual pode ser um destes três: equilíbrio, déficit ou superávit. Se o plano está equilibrado, nada a fazer. Se as reservas matemáticas apresentarem déficit, a LC 109 considera soluções possíveis nas duas pontas do negócio jurídico, do plano de benefícios: na da torneira das contribuições, dos sujeitos passivos (participantes e Patrocinador) e na torneira dos gastos com benefícios, dos sujeitos ativos (os Participantes, e unicamente os Participantes). Notem bem isso: a LC 109 não esqueceu nenhum dos lados, nenhum dos sujeitos do negócio jurídico, do Plano de Benefícios, considerou-os ambos.
E como se consegue esse reequilíbrio do Plano de Benefícios? Na ponta dos sujeitos passivos, Participantes e Patrocinador, aumentando as contribuições ou promovendo uma contribuição extraordinária. Na ponta dos sujeitos ativos (Participantes), diminuindo os benefícios dos Participantes que ainda não são Participantes Assistidos. Os já Participantes Assistidos não podem ter seus benefícios diminuídos, porque a Constituição manda respeitar o direito adquirido, o ato perfeito.
E se houver um superávit, que procedimento prescreve a LC 109? Sábia LC 109! Superávit até 25% do valor das reservas matemáticas não provocam revisão do Plano de Benefícios. Abre-se uma torneira para um tanque menor de reservas, Reservas de Contingência, para garantia de benefícios.
Considere-se bem essa cautela da LC 109, essas reservas não são gastas porque é prudente que permaneçam no negócio jurídico, no Plano de Benefícios, com o mesmo destino das reservas matemáticas, a saber, garantir o pagamento dos benefícios previdenciários contratados, a saber, aposentadoria e pensão no caso do Plano 1 de Benefícios da PREVI.
E por que essa cautela? Porque o valor dos recursos das Reservas Matemáticas é significativamente instável. Essas sobras de recursos podem ser resultado de alta desmesurada e volátil. Logo, o valor das Reservas Matemáticas poderão baixar para os valores considerados de normalidade e poderão até baixar para níveis inferiores ao da normalidade. É isso precisamente o que significa Reservas de Contingência, aquelas que se destinam a neutralizar os efeitos de algum fato imprevisível ou fortuito, que escapa ao controle, uma eventualidade, como explica o Houaiss: contingentia significa acidente, acaso.
E se, constituída a Reserva de Contingência, ainda assim ocorrer superávit com relação a ela, o que fazer? A LC 109 manda fazer o que se espera que ela mande fazer, a saber, a Reserva Especial para revisão do Plano de Benefícios.
E como se faz a revisão do Plano de Benefícios neste caso do superávit? Precisa prescrever? Há alguma dúvida? Até agora as reservas foram consideradas como recursos garantidores de gastos com benefícios previdenciários. Poderiam os recursos dessa Reserva Especial para revisão do Plano de Benefícios ser consumidos noutro objeto, que não seja este, a saber, o pagamento de benefícios previdenciários contratados, aposentadoria e pensão no caso do Plano 1 de Benefícios? Os recursos dessa Reserva Especial, que são os de fato consumidos, podem ter outro objeto jurídico? Não posso imaginar que alguém pense que esse desvio de objeto jurídico constitua exatamente o Direito, o Legal, o Justo Social! Esse negócio jurídico só tem nas pontas da relação jurídica as duas torneiras, aquelas que são claramente citadas no caso de déficit, que ligam as RESERVAS (todas as Reservas), uma ao sujeito passivo, o da obrigação de pagar contribuição, os Participantes e o Patrocinador, e a outra ao sujeito ativo, o do direito de receber a vantagem, a coisa boa, o benefício previdenciário, os Participantes.
Assim, a Revisão do Plano de Benefícios, no caso de superávit, se faz do mesmo modo que se faz no caso do déficit, a saber, manipulando as torneiras das duas pontas da relação jurídica existente neste negócio jurídico, que se chama Plano de Benefícios: a torneira das contribuições e a torneira dos benefícios. E a LC 109 tem a preocupação de ser justa e manda explicitamente que, em se tratando de solução por manipulação da contribuição, ambos os sujeitos passivos, Participantes e Patrocinador, sejam igualmente contemplados com a redução das contribuições.
Está claro que na mente do legislador, neste artigo da LC 109, a principal forma de obter o equilíbrio do Plano de Benefícios consiste nos gastos das reservas com a concessão de benefícios. Nunca passou pela mente do legislador, nem podia passar, que se pudesse cogitar de contribuição, onde a Constituição e a própria Lei só identificam reservas garantidoras de benefícios. E muito menos que se viesse a colocar na ponta do sujeito ativo (o do direito, o da vantagem, o do benefício) da relação jurídica desse negócio jurídico, chamado Plano de Benefícios Previdenciários, o Patrocinador, pessoa jurídica, sociedade anônima, produtor de lucro. E mais ainda, em pé de igualdade com o único contemplado com esse direito na Constituição e na Lei, o Participante, pessoa física, legalmente reconhecido como assistido, isto é, aposentado ou pensionista, no caso do Plano 1 de Benefícios da PREVI.
Essa reversão de contribuições onde só existem legalmente reservas é um parto de montanha! Na ponta da relação jurídica do negócio jurídico, que é o Plano de Benefícios, onde se situa o sujeito ativo, o dos direitos, só podem estar os Participantes, na conformidade da Constituição e da Lei. Somente com os Participantes Assistidos se podem consumir os recursos das Reservas, sejam elas quais forem, Matemáticas, de Contingência e Especial, porque esses recursos só podem ser consumidos em benefícios previdenciários contratados, aposentadoria e pensão no caso do Plano 1 de Benefícios da PREVI.
Vê-se que estou à procura de terreno firme de análise para o problema colocado pela Resolução CGPC 26. Acho que o mais firme fundamento reside no princípio da coerência do instituto do Direito: o corpo legal é sistêmico e hierárquico. Não pretendo ingressar em argumentos históricos, tanto das leis quanto da PREVI e do Patrocinador do Plano 1 de Benefícios, porque desviaria o foco da questão e a tornaria simplesmente fonte inesgotável de debate. Aprecio citar o que disse o Dr. Luiz Fux, Ministro do Supremo Tribunal Federal a um jornalista de São Paulo:
“A POPULAÇÃO SÓ TEM SEGURANÇA JURÍDICA A PARTIR DO MOMENTO EM QUE O MAGISTRADO SE BASEIA OU NA LEI OU NA CONSTITUIÇÃO. É CLARO QUE ESSAS LEIS, ESSAS REGRAS CONSTITUCIONAIS, PRECISAM SER INTERPRETADAS, MAS A INTERPRETAÇÃO SÓ SE OPERA QUANDO HÁ UMA DUBIEDADE NA LEI.”
Acredito que a LC 109 tinha motivos para se restringir, ao prescrever a respeito do destino dos recursos da Reserva Especial, àquilo que mandou cumprir: “Se a revisão do plano de benefícios implicar redução de contribuições, deverá ser levada em consideração a proporção existente entre as contribuições dos patrocinadores e dos participantes, inclusive dos assistidos.”
Ela foi coerente. Baseou-se no que estabelecera antes. Tinha os pressupostos do equilíbrio das Reservas Matemáticas, do regime de capitalização, da precisão da mais avançada técnica do cálculo atuarial. Não deveria existir nem déficit nem superávit. Não deveriam existir déficits nem superávits anuais continuados.
Logo, houve algum fator imprevisto, transitório ou permanente, causando o superávit. Preços altos no mercado financeiro? Aplicações demasiadamente arriscadas? Reajustes insuficientes? Benefícios defasados ou desajustados? Compromissos não cumpridos? Contribuições excessivas? Acontecimentos econômicos novos favoráveis, transitórios ou permanentes? Erros de cálculo?
Tantos podem ser os motivos desse superávit, e de valor e natureza e duração tão variados, que a LC 109 decidiu tolerar o prazo de três anos consecutivos de superávit para obrigar a revisão do Plano de Benefícios e restringir a apenas orientar que as vantagens de desoneração das contribuições (que não consomem recursos das reservas, é conveniente que se frise) devem seguir a norma da justiça equitativa entre Participantes e Patrocinador.
Os autores da Resolução CGPC entenderam que aí existe um vácuo. Trataram de preenche-lo. Mas, na minha opinião, se excederam violentando não só as Leis Complementares 108 e 109, como a própria Constituição, com o instituto da “ reversão de contribuições”, que coloca o Patrocinador na ponta da relação do sujeito ativo (o da vantagem, o da coisa boa, o do benefício) desse negócio jurídico que se chama Plano 1 de Benefícios da PREVI.
Consumir reservas previdenciárias é um benefício previdenciário, seja qual for a denominação que se lhe queira pespegar. É o conceito que procura a palavra, não é a palavra que procura o conceito, já afirmou renomado filósofo. O Plano 1 de Benefícios da PREVI só tem um único objeto, cujo nome LEGAL E CONSTITUCIONAL é BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS (aposentadoria e pensão). Qualquer outro nome é significado de outro conceito ILEGAL E INCONSTITUCIONAL, como, por exemplo, REVERSÃO DE CONTRIBUIÇÕES. Assim penso eu.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

159. Reservas

No dia 11 do corrente foram postadas no site da AAPPREVI notícias, fornecidas pela Presidente da FAAB, a respeito da reunião recente com autoridades da PREVIC, onde se discutiu o destino que se deveria dar ao superávit, apresentado no corrente ano pelo Plano 1 de Benefícios da PREVI.

Desse relato consta que as autoridades justificaram a existência da Resolução CGPC 26 nos seguintes termos: “...a Resolução 26 veio para regular a maneira como se faz a Revisão do Plano, pois as opções para tal não foram abordadas em profundidade pela lei complementar.”
Já lera alhures alguns argumentos favoráveis a essa Resolução, como o enriquecimento ilícito, o da justiça distributiva e o antecipação da entrega ao Patrocinador das gigantescas sobras, que o Plano 1 de Benefícios apresentaria no seu futuro encerramento. Para mim, esse do vácuo de lei é novidade. Será que existe mesmo vácuo de lei? Esse é o objeto dessa minha pesquisa.
A Constituição Brasileira atual trata da Previdência Complementar no artigo 202: “O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.”
O grande jurisconsulto e mestre do Direito, Miguel Reale, ministra logo na introdução à Ciência do Direito a orientação de que a análise do vocabulário da norma jurídica deve ser a primeira tarefa do advogado. Tão importante é essa análise linguística para a prática jurídica que Herbert Hart, segundo Wayne Morrison, utilizou essa metodologia linguística, inspirado pela filosofia da linguagem de Wittgenstein, no estudo do Direito, uma das mais famosas teorias da Escola do Positivismo Jurídico.
A base do instituto da Previdência privada complementar é a constituição de reservas que garantam o benefício contratado. Houaiss ensina que reserva significa “qualquer coisa que se separa, que se mantém guardada, para ser usada no futuro.” Acrescenta que tem origem no verbo latino servare, que significa preservar, salvar, assegurar a saúde ou a conservação de. Reservare tem o sentido de guardar em reserva, enquanto reservatus assume a significação de reservado para, guardado para, destinado para.
Os dicionários de termos jurídicos, de administração financeira e de contabilidade também enfatizam esses quatro elementos conceituais do vocábulo reserva: separar, guardar, garantir, com determinada destinação. Assim, encontramos na Contabilidade e no Direito as seguintes definições para reserva: determinada quantia para cobrir gastos, se vierem a ocorrer; lucros que uma empresa contabiliza à parte, para fins determinados.
Para a Constituição, pois, a Previdência Privada Complementar é no seu mais autêntico núcleo conceitual uma quantidade de recursos financeiros destinada exclusivamente a ser consumida no pagamento de benefícios contratados e em valor tal que o pagamento desses benefícios esteja garantido. A Previdência Privada Complementar só gasta os seus recursos com o pagamento de benefício contratado.
Já é bem mais evidente o significado do vocábulo benefício na linguagem de uso diário: ato de fazer o bem, auxílio, provento concedido a alguém, vantagem, direito, diz Houaiss, que também adita “na previdência social, prestação pecuniária a que tem direito pleno o beneficiário, na letra da lei”. Esse vocábulo é herdado do Latim, beneficium, bem feito, coisa boa. É, pois, evidentíssimo o pensamento da Constituição: a Previdência Privada só pode consumir recursos das reservas na forma de benefício.
Se ainda nada disso fosse suficiente para convencimento definitivo, existe o adjetivo contratado.
O pensamento do Constituinte ao editar o artigo 202 é inequivocamente este: as reservas da Previdência Privada Complementar só podem ser consumidas na forma de benefício previdenciário contratado.
A Constituição enumera os benefícios que a Previdência pode conceder e contratar, as coisas boas em que podem ser consumidas as reservas da Previdência: cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada (aposentadoria); proteção à maternidade, especialmente à gestante; proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário; salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda; pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes. Como se vê aí não se acha incluída essa coisa boa que é a reversão de contribuições. As reservas da Previdência Privada Complementar não podem, portanto, ser consumidas em reversão de contribuições.
Esse elenco constitucional nos informa outra coisa: todas essas coisas boas só podem ser despesas com eventos sofridos por pessoas físicas: doença, invalidez, morte, velhice avançada, maternidade, desemprego, família e prisão. Logo, as reservas da Previdência Privada Complementar não podem ser consumidas como benefício, coisa boa para pessoa jurídica.
Aliás, ninguém faz um contrato para obter uma reversão de contribuição. Reversão não é bem que se objetive alcançar e que se obtenha por contrato. Logo, mais um motivo constitucional para exorcizar essa reversão de contribuições: ela não pode ser benefício contratado.
Este Regime de Previdência Social Complementar recebeu a sua primeira norma legal em 1977, a Lei 6.435. A partir do ano 2001, ele passou a ser organizado sob os termos de duas leis complementares: a LC 108 e a LC 109.
A LC 109 disciplina o Regime de Providência Complementar. Ele é operado por dois tipos de entidades: EFPC (entidade fechada de previdência complementar) e EAPC (entidade aberta de previdência complementar.
A EFPC se organiza sob a forma de fundação ou sociedade civil, sem fins lucrativos. Ela pode abrigar empregados de uma empresa, ou de um grupo de empresa, ou servidores de entidades públicas ou de sociedades mistas, e, neste caso, tem PATROCINADOR, bem como associados ou membros de pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial, quando tem INSTITUIDOR. O objeto dela é a administração e execução de planos de benefícios de natureza previdenciária.
Como se está constatando, a EFPC NÃO PODE TER A FINALIDADE DE LUCRO. Se ela não pode ser fonte de enriquecimento dos participantes e assistidos, muito menos pode ela ser fonte de enriquecimento de uma empresa, de uma sociedade anônima, segundo entendo. Já a EAPC é uma sociedade anônima. Tem por finalidade o lucro e VENDE OS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS PARA OBTER LUCRO.
A PREVI É, POIS, UMA EFPC, UMA SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS, QUE CONSTITUCIONAL E LEGALMENTE SE DESTINA EXCLUSIVAMENTE A COLETAR E ADMINISTRAR RECURSOS PARA GASTAR NA FORMA DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS A SEUS PARTICIPANTES (OU A SEUS BENEFICIÁRIOS), LEGALMENTE RECONHECIDOS COMO ASSISTIDOS.
A lei denomina participante à pessoa física que adere a um plano de benefícios e de assistido ao participante ou seu beneficiário em gozo de benefício de prestação continuada. Assim, UMA PESSOA JURÍDICA NÃO SE ACHA LEGALMENTE HABILITADA PARA RECEBER BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. Nem isso tem o menor cabimento, já que pessoa jurídica não adoece, não se torna inválido nem morre.
O Patrocinador é aquela entidade que assina com uma EFPC um contrato de patrocínio de Plano de Benefícios Previdenciários para os seus funcionários. As obrigações legais do Patrocinador consistem em contribuição paritária normal com os participantes do Plano, compartilhar com os participantes das despesas administrativas, compartilhar paritariamente a direção da EFPC, com direito à indicação do conselheiro presidente e o voto de minerva, e supervisionar e fiscalizar a EFPC, inclusive autorizar, juntamente com seu ente controlador, que a EFPC exerça o controle ou participe de acordo de acionistas que tenha por objeto formação de grupo de controle de sociedade anônima.
COMO ESTÁ PATENTE NA DISCRIMINAÇÃO DO PAPEL DO PATROCINADOR, JAMAIS AS LEIS COMPLEMENTARES 108 E 109 INCLUEM O DIREITO DO PATROCINADOR A COMPARTILHAR DO RESULTADO FINANCEIRO DA EFPC, DE OBTER QUALQUER VANTAGEM NAS DESPESAS COBERTAS PELAS RESERVAS DE UM PLANO DE BENEFÍCIOS. O PATROCINADOR SÓ TEM DIREITOS E DEVERES DE CONTRIBUIR, COMPARTILHAR A ADMINISTRAÇÃO, SUPERVISIONAR E FISCALIZAR.
A Lei manda que a EFPC faça o plano de custeio anual, estabelecendo a contribuição exigida para a constituição de reservas garantidoras de benefícios, fundos, provisões e demais despesas. Obrigatório é o regime financeiro de capitalização para os benefícios de programação programada e continuada. As reservas técnicas, provisões e fundos de cada plano de benefícios e os exigíveis a qualquer título deverão atender permanentemente à cobertura integral dos compromissos assumidos pelo plano de benefícios, ressalvadas excepcionalidades definidas pelo órgão regulador e fiscalizador. AS CONTRIBUIÇÕES (NORMAIS E EXTRAORDINÁRIAS) DESTINADAS À CONSTITUIÇÃO DE RESERVAS TERÃO COMO FINALIDADE PROVER O PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS DE CARÁTER PREVIDENCIÁRIO.
No final de cada exercício, faz-se o balanço do Plano de Benefício. Sendo o resultado superavitário, ele constitui uma reserva de contingência, até o limite de vinte cinco por cento do valor das reservas matemáticas (técnicas) PARA GARANTIA DE BENEFÍCIOS, diz a lei.
ESSAS RESERVAS MATEMÁTICAS, PORTANTO, SOMENTE ENCERRAM OS RECURSOS EXATAMENTE EQUIVALENTES AO VALOR DOS BENEFÍCIOS A PAGAR. Isso é o que significa EQUILÍBRIO. Esses ativos são da exata medida dos benefícios. Nem mais nem menos. Daí não há como se extrair nenhum valor para pagamento outro que não seja benefício previdenciário, porque o plano ficaria desfalcado. O objetivo da administração de uma EFPC é alcançar esse equilíbrio: a exata correspondência entre as reservas matemáticas e o valor dos benefícios a pagar.
Se o balanço do fim de exercício da EFPC acusar excesso de recursos sobre o valor de equilíbrio das reservas matemáticas, esse excedente não será, sem mais nem menos, consumido em benefícios, o único destino constitucional conferido às reservas. Não, a Lei é minuciosa e cautelosa. Afinal de contas, é uma Lei de Previdência...
A Lei manda que o excesso eventual de reservas forme um colchão de segurança para as reservas matemáticas: as reservas de contingência, para garantia de benefícios, diz textualmente a Lei 109. Outra vez, a clara fidelidade ao pensamento dos Constituintes: nos planos de previdência complementar só existem recursos para serem consumidos com benefícios previdenciários.
Esse colchão de garantia de benefícios previdenciários pode atingir até o valor correspondente a 25% do valor das reservas matemáticas, do valor atual dos benefícios a conceder, atuarialmente calculado, isto é, matematicamente, com a precisão matemática, calculados.
Mas, a Lei continua sendo minuciosa e pretendendo baixar normas cautelosas sobre o consumo das reservas matemáticas, dos valores que só têm um destino constitucional: serem consumidos em benefícios, exatamente por isso, porque elas são do exato tamanho dos benefícios. E a Lei 109, então, levanta nova hipótese: constituídas as reservas de contingência, para garantir os benefícios previdenciários, se ainda assim, houver superávit, esse valor que excede aos 25% das Reservas de Contingência, constituirá outras reservas, a RESERVA ESPECIAL PARA REVISÃO DO PLANO DE BENEFÍCIOS.
E a Lei 109 prossegue no seu minucioso ordenamento, supõe que se faça a revisão anual, segundo entendo. Mas, até condescende com a cautela eventual dos administradores da EFPC em mais espaçar essa providência, haja vista a característica de instabilidade da área financeira, e até porque pode ser insignificante essa quantia a distribuir. Passados três exercícios consecutivos, porém, com superávit e sem distribuição da reserva especial, a revisão do plano de benefícios torna-se obrigatória, mesmo que o valor seja insignificante.
E a lei, seguindo sua linha de minuciosa ordenação, acrescenta: SE A REVISÃO DO PLANO DE BENEFÍCIOS IMPLICAR REDUÇÃO DE CONTRIBUIÇÕES, leve-se em consideração a proporção existente entre as contribuições do patrocinador e dos participantes, inclusive assistidos. É que neste ponto do processo analítico, o legislador se deparou não só com a Reserva Especial Para Revisão do Plano de Benefícios, mas também com as contribuições que poderão ingressar nas reservas do Plano de Benefícios, isto é, a fonte de recursos que formam essas Reservas, assim como ele também se encontra com o destino das Reservas, a saber, os benefícios dos assistidos e até os futuros benefícios dos participantes. Nada mais ele encontra, porque nada mais existe que possa ser identificado.
A solução para obter o EQUILÍBRIO DO PLANO MEDIANTE A REVISÃO reside, portanto, nos dois lados: o lado das contribuições e o lado dos benefícios. E a LC dá primazia à solução pelo lado das contribuições: reduzam-se ou até suspendam-se, ambas as dos participantes, inclusive assistidos, e a do Patrocinador. Ele considerou as duas, porque ambas existem. E nessa providência não são consumidos recursos das reservas. Não são transferidos recursos das reservas do Plano de Benefícios para o patrimônio dos contribuintes, quer participantes quer Patrocinador. Não se trata de benefício previdenciário, portanto. Trata-se de poupança privada.
E, se essa solução não for suficiente, agora sim, e só agora ela ordena: consumam-se as reservas. Precisava dizê-lo? Não. É o único destino Constitucional. É tudo o que a LC vem insistindo em afirmar: contribuições normais e extraordinárias são para formar reservas matemáticas, que devem ser exatamente iguais aos benefícios a pagar. Até 25% de excesso formam reservas para garantir o pagamento dos benefícios. Excesso acima desse valor é para Revisão do Plano de Benefícios. Que benefícios? Previdenciários, e somente benefícios previdenciários contratados, manda a Constituição. Quem recebe benefícios previdenciários? Pessoa física, participante legalmente qualificado, assistido. Pessoa jurídica, segundo a Constituição e segundo as duas LC 108 e 109, não se qualifica para receber benefícios previdenciários, os recursos das reservas não lhe podem ser destinados.
Nesta matéria de REVISÃO DO PLANO DE BENEFÍCIOS, a LC 109 se estende, minuciosa e compreensivamente, sobre a sua repercussão sobre as contribuições. Se houver déficit, aumente-se a contribuição ou cobre-se contribuição extraordinária, e até, ISSO É IMPORTANTÍSSIMO, REDUZA-SE O BENEFÍCIO A CONCEDER, NUNCA SE REDUZA O BENEFÍCIO JÁ CONCEDIDO.
A LC 109 foi tão minuciosa que teve até a intenção de ser bem clara, evitando qualquer possibilidade de vácuo legislativo. O que o legislador não fez, foi o que ele não podia fazer, a saber, identificar contribuições passadas, onde existem reservas a serem consumidas em benefícios previdenciários. Não existem contribuições passadas. As contribuições existem no momento em que ingressam no Plano de Benefícios. Ingressados os recursos no Plano de Benefícios, ali somente existem RESERVAS e RESERVAS MATEMÁTICAS, isto é, RECURSOS NO VALOR EXATO DOS BENEFÍCIOS A PAGAR. São cálculos atuariais, matemáticos, os cálculos mais precisos quanto o podem ser.
E o Constituinte tanto quanto o Legislador não podiam levar em conta essa pretensa contribuição passada, ressuscitada das reservas excedentes de excedentes de reservas matemáticas, ressurreição tão mirabolante que nem matéria cadavérica existe, mera fábula, porque em matéria de Previdência Social eles não se regem pela justiça comutativa (a justiça dos negócios, a justiça de talião, do tal qual, da igualdade das coisas trocadas), nem pela justiça distributiva (a justiça da igualdade das relações pessoa/coisa, a justiça da repartição dos lucros segundo a grandeza da participação no capital), mas sim pela justiça social (a igualdade das pessoas, o válido é igual ao inválido, o válido trabalha para o inválido, o rico divide com o pobre, o capital divide com o trabalho, Bill Gates divide com o habitante de palafitas, o trabalhador válido compra antecipadamente a sua renda da época da inatividade, e nunca, nunca mesmo, o contrário!), é o que nos ensina Luís Fernando Barzotto. É a própria Constituição que consagra a Justiça Social no seu portentoso artigo 193, o de abertura do Título VIII da Ordem Social: “A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais.”
RESERVAS PARA BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS CONTRATADOS NÃO PODEM SER CONSUMIDAS COM O PAGAMENTO DE REVERSÃO DE CONTRIBUIÇÕES PARA PARTICIPANTES, E MUITO MENOS, PORQUE JÁ RAIA AO ABSURDO, PARA PATROCINADOR.
Na minha opinião, pois, NÃO EXISTE VÁCUO CONSTITUCIONAL E LEGISLATIVO QUE ENSEJE A ELABORAÇÃO DE RESOLUÇÃO NOS TERMOS DA RESOLUÇÃO CGPC 26, CRIADORA DA “REVERSÃO DE CONTRIBUIÇÕES”
Antes que encerremos estas reflexões com um resumo das principais conclusões dessas normas legais, lembremos o preceito constitucional que se mostra oportuno: “NINGUÉM SERÁ OBRIGADO A FAZER OU DEIXAR DE FAZER ALGUMA COISA SENÃO EM VIRTUDE DE LEI.”
A Constituição dá uma única destinação às contribuições: formar reserva. E dá uma única finalidade para essa reserva: pagar benefícios previdenciários.
A EFPC não pode gerar lucro. Logo, não pode gerar lucro para o participante nem para o patrocinador.
A EFPC, ao contrário da EAPC, existe exclusivamente para pagar benefícios previdenciários (aposentadoria e pensão).
As contribuições (normais e extraordinárias) que se destinam a formar reservas têm apenas um único destino: pagamentos de benefícios previdenciários.
Num Plano de Benefícios não existem contribuições. Existe patrimônio de uma EFPC. Existem reservas que só podem ser consumidas em pagamento de benefícios previdenciários.
As reservas matemáticas assumem o exato valor dos benefícios a pagar, nem mais nem menos. Logo não existe como daí extrair recursos que não sejam para pagamento de benefícios previdenciários aos participantes legalmente habilitados a recebê-los.
A reserva de contingência existe unicamente para garantir o pagamento de benefícios, isto é, fornecer garantia de proteção às reservas matemáticas.
A reserva especial destina-se à revisão do plano de benefícios, ou reduzindo o valor das contribuições, ou suspendendo-as totalmente, ou na forma de benefício propriamente dito.
Só o participante de uma EFPC, legalmente habilitado, pode receber recursos provenientes de uma das três reservas (matemáticas, de contingência e especial). O Patrocinador somente poderá auferir a vantagem da redução ou da suspensão de contribuição, que não é um benefício previdenciário.
O Patrocinador jamais poderá auferir recursos provenientes dessas reservas (matemáticas, de garantia e especial), porque não é pessoa física (não adoece, não fica inválido e não morre). É pessoa jurídica.
Entre as descrições legais do papel do Patrocinador de uma EFPC não se acha o de poder ser ele aquinhoado com um benefício previdenciário ou de uma transferência de recursos de qualquer dos três tipos de reservas (matemáticas, de contingência e especial).
A PREVI é uma EFPC, uma sociedade sem fins lucrativos. Não é uma EAPC. Logo, não pode operar para obter lucro para si, nem para os participantes nem para o Patrocinador.
Não existe vácuo constitucional e legislativo que justifique a “reversão de contribuições”, constante da Resolução CGPC 26, em benefício do Patrocinador.

domingo, 19 de junho de 2011

158. O Significado

Os mestres da Ciência Física nos ensinam que no Universo somente existem partículas em movimento, partículas-ondas, que se atraem e se repelem. Essa atração e essa repulsão são efeitos resultantes da ação de forças inerentes às partículas-ondas. As partículas-ondas são, pois, energizadas. Há duas formas fundamentais de energia: a eletromagnética (que engloba as energias nucleares fraca e forte) e a gravidade.
A ação da força não provoca o movimento, isto é, o deslocamento de uma coisa de um lugar para outro. Ela apenas acelera o movimento, isto é, muda a velocidade ou a direção do movimento. O movimento é a relação dos deslocamentos de duas coisas. Se as duas coisas se deslocam à mesma velocidade, elas estão paradas com relação uma à outra. Eu estou à velocidade zero, com relação à Terra, isto é, estou parado, enquanto estou, juntamente com a Terra, a altíssima velocidade com relação ao Sol. Aliás, tanto a Terra se movimenta com relação ao Sol, como o Sol se movimenta com relação à Terra. O movimento é relativo, é o deslocamento de uma coisa com relação a outra coisa.
A Ciência é sistêmica, isto é, é uma unidade coerente. As diversas ciências não podem contradizer-se. Assim, compreendemos que a Neurociência hoje afirme que no Universo não exista luz, nem cores, nem som. O Universo é escuro e silencioso, é cego e mudo. É que a luz e a cor, na realidade física, nada mais são que energia eletromagnética, assim como o som nada mais é que a vibração das partículas aéreas.
O meu corpo nada mais é, em última análise, que imensa multidão de partículas-ondas energizadas que se deslocam à mesma velocidade. Assim, isso é o corpo do leitor, a caneta com que escrevo, o copo que uso para beber, as árvores, os animais, os planetas, as estrelas e as galáxias, todas as coisas.
O espaço não existe no Universo senão como universo, isto é, como o conjunto de partículas-ondas energizadas. O espaço não é um continente das coisas. O espaço é o conjunto de coisas cuja relação de proximidade, distância e orientação o meu aparelho de comunicação, a Mente, constrói, organizando o universo das coisas, uma em relação às outras. Nas longínquas paragens interplanetárias e intergalácticas, nada existe. Nem o espaço existe. É o vácuo. É o Nada. Sei que a Física Quântica afirma que não existe o vácuo absoluto: existem locais com raridade de partículas-ondas.
O espaço é a relação entre os lugares das coisas, lugares e relações que podem mudar e mudam constantemente, já que as coisas podem estar, ou não, se movimentando reciprocamente em velocidades diferentes. As coisas podem estar se aproximando ou se afastando, ora se aproximando ou ora se afastando, ou podem permanecer à mesma distância. O Universo é o imenso torvelinho do movimentar-se de partículas-ondas energizadas, produzido ao acaso de forças da atração e repulsão. É o transformar-se. É mero processo, o tornar-se, o fieri. Nada é. Tudo muda. Tudo é processo. O espaço é relativo.
O espaço é uma construção da Mente, esse instrumento de comunicação do indivíduo humano com o Universo e, sobretudo, com as outras pessoas. Esse aparelho de comunicação humano consta do sistema nervoso, anatômica (hardware) e fisiologicamente (software) considerado, acrescido de todas as diversas funções de ordens cognitivas e emocionais. Não há como conhecer as coisas, na pureza absoluta de sua realidade. As coisas não se colam em nossa Mente. Tudo que conhecemos passa por esse instrumento de conhecimento. Conhecemos tão somente as coisas que a Mente tem condições de captar, as coisas que se adaptam ao nosso aparelho de comunicação e na forma como ele é capaz de captar. Conhecemos apenas a imagem que nossa Mente forma da realidade física existente.
A Verdade, adequação da imagem mental com a realidade física pura, essa Verdade absoluta, não existe, porque nos é impossível ter, de um lado, a imagem mental, e, do outro, a realidade física pura, para, em seguida, compará-las. De um lado e de outro, só conseguiremos a imagem da realidade física formada pela Mente. Até a verdade científica é a confirmação experimental dessa subjetividade da Verdade, já que ela nada mais que a imagem que a Mente dela faz, a mais conveniente para orientar nossa conduta futura. A Cosmologia ensina que 95% do Universo é constituído de energia negra e matéria negra, que não sabemos o que é. Só 5% do Universo é captado e estudado atualmente por esse instrumento de comunicação humano, a Mente, cujo poder de captação é ampliado com diversos outros instrumentos construídos pelo Homem, como o telescópio e o microscópio.
Assim também é o tempo. Ele não existe. Na realidade ele é apenas a relação entre um antes e um depois, um estado anterior e um estado posterior, um lugar ocupado anteriormente e outro ocupado posteriormente. Ele é a relação de continuidade desse deslocamento de um lugar anteriormente ocupado para um lugar posteriormente ocupado. Por sinal, aquela ocupação anterior do lugar só existe na minha memória. Essa relação, portanto, é nitidamente uma construção da Mente. Uma construção que pode até ser medida, através do relógio. Uma convenção em que a distância entre dois pontos é dividida em partes convencionalmente iguais (segundos, ou minutos, ou horas), cada parte constituindo uma unidade de tempo. Ali no relógio não existe tempo. Ali existe projeção mental de espaço (criação da Mente como já vimos) e deslocamento do ponteiro em unidades de espaço, isto é, movimento do ponteiro, convencionalmente (mentalmente) medido. Outra vez, o relógio não é o tempo. O relógio é coisa em movimento, com medição de distância percorrida através de intervalos iguais. O tempo é relativo.
Luz, cor, som, espaço e tempo são produtos da Mente. Nada que é externo ingressa na Mente, senão a energia: energia eletromagnética através dos olhos, energia química através do paladar e do olfato, energia cinética através do ouvido, energia mecânica e bioquímica através do sentido somestésico. Esses diversos tipos de energia são transformados pela Mente em um só tipo de energia, a energia neural (eletromagnética e bioquímica), digamos assim. Essa energia é gerada com a transformação da energia externa recebida pela Mente em energia analógica, que é convertida em energia digital. Essa energia digital é manipulada por um conjunto de neurônios e sinapses que produzem os fenômenos mentais. Para que se tenha ideia da infinita variedade de fenômenos produzidos pela Mente basta saber que o cérebro tem cem bilhões de neurônios e a média de conexões de um neurônio monta a dez mil. Afirma-se que nos intestinos existem outros cem bilhões de neurônios.
A energia externa sensibiliza os receptores sensoriais, a porta de entrada para a Mente, e percorre um dos infinitos caminhos que lhe é possível percorrer na Mente. Cada neurônio dá o seu significado à corrente eletromagnética neural e cada circuito de neurônios percorridos forma, digamos assim, um discurso ou um texto de significados. Há o circuito da luz, da cor, do movimento, da palavra, das percepções, do entendimento da palavra, da música, das formas, do rosto, da música, das emoções, do amor, do ódio, do medo, da coragem, das fantasias, da religiosidade, da memória, das ideias, dos juízos, do raciocínio, da ética, do egoísmo, da solidariedade, de tudo o que se possa imaginar, até o circuito do autossegredo. Há finalmente o circuito da liberdade, aquele da autonomia individual, aquele que confere ao indivíduo humano a sua dignidade de pessoa humana.
Os indivíduos humanos não nascem com um aparelho mental absolutamente idêntico. As Mentes são apenas parecidas, umas muito parecidas, outras até pouco parecidas. Há até indivíduos humanos que nascem anencéfalos. Não se nasce também com ele já apto para funcionar em toda a sua plenitude. Como todas as coisas, ele também é um processo. Ele tem início, desenvolve-se, chega a sua plenitude e entra em decadência. Seja como for, esse aparelho de complexidade orgânica possui a característica da plasticidade. Isso significa que ele também segue as etapas de seu processo sob a influência do meio ambiente.
Uma Mente normal é capaz de aprender qualquer coisa, com maior ou menor perfeição, com maior ou menor facilidade. Ela fará melhor uma coisa quanto mais nela se exercitar. Mas ela terá mais facilidade no exercício daquilo para o qual ela for mais adaptada. O ser humano constroi a sua essência e contribui para a construção de todo o acervo cultural da Humanidade, entre outras coisas, a própria Sociedade. Da mesma forma, a Sociedade é o grande artífice do indivíduo humano, utilizando a forma da Cultura acumulada para moldá-lo.
Esse aparelho maravilhoso de comunicação, a Mente, é que constrói o Universo da nossa vida, esse com que convivemos. Um conglomerado de partículas toca no meu, e eu sinto o prazer do contato com uma pele macia, ou a dor de uma bala no peito. Lá fora só existe o contato de conglomerado de partículas-ondas em movimento. O prazer e a dor são produtos da Mente, só existe em minha Mente. São meras sensações. O que o leitor está lendo é, no Universo físico, mera tinta sobre um papel, isto é, mero conglomerado de partículas-ondas em movimento com igual velocidade. Na minha Mente, é um universo de ideias que governam a minha vida! Um conglomerado de partículas movimenta-se atrás de outro. Minha Mente capta um leão correndo atrás de um homem. Percebo a cena, entendo o perigo e o sofrimento humano. Minha Mente constrói toda uma cena de luz, de cor, de animal, de pessoa, de perigo, de infortúnio, de morte, de sofrimento humano. Outro seria o significado no cenário de um estádio de atletismo, outras ideias, outros sentimentos, outras emoções, outro comportamento.
O Mundo criado pela Mente é que é o Mundo que conta, diria Hegel, sob a influência de Kant e no rastro de George Berkeley. Seria o Mundo da Razão Prática, aquele que conta para Kant. Nós estamos criando, a cada instante, um novo Mundo, uma nova Sociedade, um novo Brasil. Alguém já disse: se a Humanidade desaparecesse não faria falta alguma ao Universo. Pode-se retorquir: se a Humanidade não existisse, não existiria Universo, e, se a Humanidade desaparecesse, também desapareceria o Universo. O que conta é o Mundo que nós queremos construir. E parece que o Mundo inteiro anseia por construir algo novo, algo bem melhor do que o Mundo em que hoje vivemos.