sábado, 27 de maio de 2017

382. A Pedido, Jesus é Deus!

Pessoa muito querida recebeu um vídeo de recente entrevista de Augusto Cury com a apresentadora Maria Braga, onde ele declara a recuperação da fé na divindade de Jesus Cristo, em razão de sua pesquisa científica da vida de Jesus, ao longo de muitos dos seus últimos anos. Este meu texto nada mais é que minha desprentensiosa manifestação a respeito, em resposta a uma solicitação de apreciação do conteúdo desse vídeo.

Augusto Cury ocupa lugar no panteão dos literatos mundiais, cujo sucesso se constata com a milionária vendagem de sua maravilhosa obra. É psiquiatra de nome nacional. Sua obra de análise da personalidade de Jesus merece o maior respeito. Claro, pois, que não possuo credenciais para fazer crítica respeitável sobre o vídeo. Sou, todavia, pessoa humana e, como tal, posso formar opinião sobre o que acabo de ouvir nesse vídeo e naturalmente a formo. Essa opinião racional é a minha luz pessoal sobre a matéria, é a que naturalmente me orienta na vida a esse respeito e sob a influência da qual se embasa a responsabilidade pela minha conduta nesse assunto.

Cury afirma que passou no crivo de sua análise psicológica as vidas e personalidades de Jesus e de seus discípulos (Pedro, João, Tiago, Mateus, Judas etc.). Mateus não foi um dos apóstolos de Jesus, embora isso não tenha importância para a ilustração do caso, porque se admite que haja sido discípulo.

O importante é que CURY afirma que estudou a vida REAL de Jesus, opondo-se ao que afirma a CIÊNCIA: A VIDA REAL DE JESUS É DESCONHECIDA. Sabe-se apenas que ele existiu e morreu crucificado na época em que Pôncio Pilatos era governador romano da Palestina. Tudo mais é mito, fabricação do imaginário religioso de multidão de pessoas, ignorantes umas, eruditas outras, conhecidas dele algumas, nada relacionadas pessoalmente com ele  uma multidão, ao longo de um século. Entre a abalizada OPINIÃO CIENTÍFICA de Cury e a VERDADE CIENTÍFICA DA HUMANIDADE, fico com a Humanidade: Cury estudou um Mito.

Para entender-se a força de um Mito, basta atestar o que se passa aos nossos olhos. Para os petistas crentes na genialidade de Lula ele é o mais genial líder político já visto na Terra, SEM NEM SEQUER NECESSITAR DE ESTUDO, inclusive A PESSOA MAIS PROBA ATUALMENTE VIVA NA TERRA, e não adianta apresentar MUITOS VÍDEOS ONDE LULA EXIBE A MAIS PATENTE FALTA DE CARÁTER. E este fanatismo é apenas político, não é o fanatismo religioso dos primeiros cristãos que mataram mais cristãos do que os imperadores romanos.

Entendo que, de fato, Jesus tenha sido extraordinário personagem e que tenha influenciado sobremaneira três pessoas, que, com ele, são os responsáveis pela existência e enorme influência que o Cristianismo primitivo teve sobre o Imperador Constantino, o responsável, este sim, pelo grande sucesso do Cristianismo: Maria Madalena, Pedro e, sobretudo, Paulo.

O Cristianismo é paulinismo. Os quatro Evangelhos apresentam suposta   autoria exatamente para conferir autoridade de procedência ocular e familiar da história, embora se admita que três deles tenham influência da mesma origem que o de Marcos, o mais primitivo, a saber,  as suas duas vertentes,  o pré-marcos, por sinal resumidíssimo, e outra cujo texto é hoje totalmente desconhecido. Os quatro evangelhos foram escritos sob a influência da crença de São Paulo. E Paulo de Tarso NÃO FOI DISCÍPULO DE JESUS, NEM TALVEZ O HAJA SEQUER VISTO EM VIDA.

TUDO O QUE PAULO DE TARSO DIZ TER APRENDIDO COM JESUS, DIZ TER APRENDIDO POR CONTATO COM JESUS RESSUSCITADO, isto é, JESUS TRANSMITIU-LHE DEPOIS DE MORTO EM APARIÇÕES, POR CONTATO  MÍSTICO, como naquele primeiro encontro na estrada para Damasco!

Esta opinião já vai longa. Penso que é satisfatória como esclarecedora do que penso: fico com a HUMANIDADE, com a CIÊNCIA. Os quatro evangelhos são narração de crentes, como Paulo de Tarso, judeu e cidadão romano, que criam que Jesus, mais que o Messias prometido aos israelitas, era um ser divino, à moda dos deuses gregos e romanos, que promoveu a catarse da Humanidade perante a divindade suprema, o Deus Pai, a redimiu do pecado,  a causa dos sofrimentos e da morte. O Homem imortal agora passaria a viver SEM DOR NO CORPO E ANGÚSTIA NA ALMA, a felicidade tal qual entendia Epicuro e as pessoas a entendem.

Essa pregação de Paulo de Tarso, a igreja UNIVERSAL, a do Mundo então conhecido, suplantou a própria igreja primitiva de Jerusalém, a igreja da MÃE E DOS IRMÃOS DE JESUS, a crença no Jesus, o Messias do povo israelense.


quarta-feira, 24 de maio de 2017

381.O Homem é a Medida de Todas as Coisas


Tales, há dois mil e oitocentos anos, fixou novo rumo para o destino da Humanidade. A explicação da Natureza, do ambiente em que vivemos, incluindo nós mesmos, não se obtém através de um relato imaginoso de ações perpetradas por entes superiores. O conhecimento da Natureza se adquire observando a Natureza e identificando as razões por que ela se comporta da forma como se comporta.

Ao longo de duzentos anos, os filósofos gregos se concentraram na análise da contingência dos seres da Natureza: nada se cria, nada se aniquila, tudo se transforma. Esse princípio da transformação, induzido por Tales, provocou um debate ao longo de duzentos anos.

O debate surgiu de uma concordância básica: a transformação só é inteligível, se houver algo permanente, isto é, os seres principiam como algo no qual eles acabam e, portanto, é aquilo que eles de fato são.

Assim, os seres têm um princípio e esse princípio é o que eles, de fato, são: o princípio é a própria Natureza. Identificar o princípio das coisas, pois, é identificar a própria Natureza, o que, de fato, a coisa é.

Naqueles tempos, os gregos pensavam que a Natureza era constituída de quatro elementos: a água, a terra, o ar e o fogo. Tales entendeu que o princípio e, portanto, a Natureza, é a água. Tudo é água. Tudo vem da água e tudo termina em água. Anaxímenes pensou que o princípio é o ar, ar que é movimento, e tudo põe em movimento e dá vida. O ar que dá vida aos animais e aos homens e que esses seres exalam na hora da morte. O  próprio Mundo possui uma alma, que o põe em movimento. Anaximandro, discípulo de Tales e mestre de Anaxímenes, adotou teoria ainda mais sutil, antecipando até mesmo o aspecto premunitório de soluções científicas modernas, puramente racional, dedutivo – a Razão, a faculdade de conhecer, de captar as causas das coisas, dos fenômenos, que os sentidos não podem atingir. Anaximandro entendia que até os quatro elementos tinham como princípio o ápeiron, isto é, provinham de algo infinito, quantitativa e qualitativamente infinito. O princípio, a Natureza é o ápeiron. Tudo é o ápeiron. Pitágoras, matemático, adotou o número como princípio e natureza, tudo é número, isto é, a transformação se processa sob a influência dos elementos do número, o ilimitado e limitante, de modo que tudo se faz num determinado tempo e numa determinada quantidade, promovendo a diversidade das coisas e a harmonia dos seres e do Cosmo: tudo é número.
Três desses filósofos, denominados Naturalistas, merecem destaque. Heráclito, o obscuro, afirmou que o princípio, a Natureza é o devir, o transformar-se: “Tudo flui”, sou o que sou neste instante, não mais sou o que fui, nem ainda sou o que serei, sou como um rio é: as águas escorrem, se renovam a cada instante. A existência é luta de contrários (o úmido contra o seco, o quente contra o frio, a fome contra a saciedade, o crime contra a justiça, etc.), que produz a diversidade das coisas, e, ao final, a harmonia dos contrários, a harmonia do todo: as coisas se encaixam, se completam.

Segundo Parmênides só existe o ser, porque o ser não pode provir do nada, não pode ser nada, nem pode deixar de ser. O ser é eterno, imutável e uno. A Natureza é o Ser. Esse ambiente que nos circunda, com essa variedade de seres mutáveis, é aparência, ilusão, inexiste! Parmênides era um racionalista extremado, centrado nos princípios da identidade e da não-contradição, extraindo de tais premissas todas as consequências, identificando o racional com real.

E, por fim, Demócrito, segundo o qual, existem os átomos, o nada ou vácuo, e o movimento. O átomo, como diz o nome, é indivisível, indestrutível, incriado, invisível de tão pequeno, eterno e dotado de movimento. Os átomos movimentam-se no vácuo, agregando-se e segregando-se, produzindo a diversidade dos seres e produzindo o fenômeno da transformação. A razão de Demócrito, sem lente, sem telescópio, sem radar, sem chips, captou, à sua maneira, o invisível, o átomo da Física Quântica! E, pasme-se, o átomo, sabemos hoje, existe. Segundo Einstein, pasme-se, ele é energia condensada! Mas, Demócrito, como pode EXISTIR o NADA? Porque, sem o Nada e sem o movimento, não se explica o ser contingente (o ser que tem começo e fim, o ser que se transforma), isto é, os seres que nos circundam, que formam a Natureza, exatamente, o ser cuja existência queremos entender, explicar, encontrar a razão de existir!

Duzentos anos decorridos, a Grécia já não era a mesma. Limitada ao mar Egeu, na época de Tales, século VII AEC Expandira-se para o Oeste pelas margens sul e norte do Mar Mediterrâneo. No século V AEC já possuía cidades-estado  nas margens sul e norte do mar Mediterrâneo, na Sicília, no sul da Itália. A economia, antes praticamente agrícola e citadina, expandira-se e diversificara-se. Era agora agrícola, artesanal, comercial, citadina e intercitadina. A vida social não se restringia mais apenas às festas religiosas e à prática da ginástica com os jogos olímpicos e a formação do cidadão guerreiro, o defensor da cidade. A cultura grega expandira-se para além da poesia, abarcava agora o teatro, a oratória, o Direito e a Filosofia. A sociedade não mais constava apenas de duas classes de cidadãos os eupátridas, os bem nascidos, os latifundiários, os ricos, e os pobres (pequenos agricultores, rendeiros e artesãos), já que, duzentos anos passados, existiam os comerciantes, os marinheiros, os professores de retórica, os pintores, os escultores, os arquitetos, os filósofos, os médicos, marinheiros, os artesãos, os artífices, os mineiros etc. A própria organização política de Atenas sofrera profunda modificação. Na época de Tales, Atenas era governada pelo Basileu, uma espécie de rei, nascido numa família eupátrida, sob o controle do Areópago (conselho de 500 eupátridas). Foi, em seguida, governada pelos Arcontes, que eram eupátridas. Passou pelas reformas legislativas de Dracon e de Solon. Seguiram-se os governos dos Tiranos. Duzentos anos decorridos, Atenas era uma democracia, cuja população alcançava 400.000 mil pessoas. 360.000 pessoas não eram cidadãos (200.000 eram escravos, 60.000 eram mulheres e crianças, e 100.000 eram metecos, isto é, artesãos estrangeiros) e apenas 40.000 cidadãos, isto é, homens, nascidos na cidade-estado de Atenas, que pagavam tributo e defendiam a cidade na guerra, e. por isso, tinham o direito de, em conjunto, através do debate, fazer as leis da cidade e escolher quem governá-la segundo tais leis e quem julgar os criminosos na conformidade de tais leis. O ostracismo, expulsão da cidade, era a pena para o homem público ímprobo.

Como se percebe, a cidade-estado grega, a cidade de Atenas, era muito bem diferente das sociedades que os gregos encontravam pelo resto do Mundo então conhecido por eles no norte da África e no sudoeste da Europa. Os atenienses, os gregos, em geral, nutriam orgulho da sociedade que haviam conseguido organizar: os gregos eram civilizados, os demais povos eram bárbaros, selvagens. Mais, eles percebiam que haviam progredido, que sua sociedade havia se transformado para melhor. E os filósofos tomaram conhecimento, ademais, que a razão pode levar a opiniões diferentes sobre o mesmo assunto, já que se defrontavam com muitas e variadas explicações da mesma matéria, a Natureza, ao longo desses duzentos anos.

Entendemos, assim, o segundo grande passo, lento passo de dois séculos, dado pela Humanidade nesse maravilhoso processo do conhecimento. O objeto da pesquisa transportou-se da Natureza para o próprio Homem. Nisso exatamente reside a importância da contribuição dos filósofos gregos, denominados Sofistas (sábios): o objeto da pesquisa deles era o Homem. Melhor, os sábios passaram a entender que a discrepância entre os filósofos antecessores brotava do fato de que eles não atentavam para o fato de que o conhecimento é um ato humano e, portanto, era, sobretudo, no Homem que se localizava o problema do conhecimento, e, assim, era no Homem que se teria de encontrar a resposta explicativa da Natureza, a razão de ser das coisas.

Esse é exatamente o significado do histórico pronunciamento de Protágoras, o maior dos três grandes filósofos sofistas: “O homem é a medida de todas as coisas.”

                                              

segunda-feira, 15 de maio de 2017

380.O Berço da Ciência


Marilena Chaui ensina que os gregos usavam a palavra lego para significar reunir, juntar. Assim, usavam a palavra logos para significar palavra, pensamento e ser. Esse ensinamento me oferece a melhor chave para abrir a porta para o meu entendimento de como se deu o primeiro passo da Humanidade na direção da aquisição da Ciência.

Falar é juntar sons, palavras. Pensar é juntar conceitos, juízos, raciocínios. Fazer, criar objetos é juntar coisas. Destruir objetos é separar partes do objeto. Se bem observarmos as coisas ao nosso redor, nada surge subitamente inteiro a nossa frente e nada desaparece subitamente inteiro diante de nós.

Essa foi a grandiosa intuição de Tales, em Mileto, cidade grega, hoje turca, há dois mil e oitocentos anos: nada se cria, nada perece, tudo se transforma. O gelo não brota repentinamente e desaparece repentinamente; o gelo se transforma em água, e a água se transforma em ar, e o ar se transforma em nuvem, e a nuvem se transforma em água; o metal se transforma em líquido e o líquido reverte a metal; a semente se transforma em planta, a planta se transforma em flores, as flores se transformam em frutos, os frutos se transformam em sementes; o dia se transforma em noite e a noite se transforma em dia.

Tales captou, induziu, observando a natureza, o princípio da transformação: tudo se transforma. Ele tem, agora, pois, um juízo - tudo se transforma – obtido pela observação da natureza. A esse juízo, ele, então, junta outro, obtido de sua razão, de sua mente. É a hipótese, isto é, algo que torne a realidade racional, uma harmoniosa imagem conceitual da realidade, uma reunião de juízos tal que um não se oponha ao outro, uma reunião de conceitos tal que um não se oponha ao outro. A realidade deve ser harmoniosa, as partes da realidade devem encaixar-se. A imagem da realidade deve ser harmoniosa, os juízos e conceitos devem igualmente encaixar-se.

O conhecimento científico é, pois, um raciocínio, isto é, o esforço da mente por tornar a realidade racional, em harmonia com a mente humana, com a lei de harmonia que rege a aglutinação dos juízos e dos conceitos humanos. A ciência é a busca da razão das coisas. É o conhecimento justificado. É conhecimento indutivo, baseado na experimentação e por ela controlado, e conhecimento dedutivo, tudo comprovado pela experimentação. É a tentativa de encontrar na realidade a mesma harmonia racional da mente. O conhecimento científico parte do pressuposto de que a Natureza está igualmente dotada da harmonia racional.


Naquele dia, em que o sábio grego Tales passou a pesquisar o princípio de onde tudo provém, que é tudo porque é aquilo de que tudo é feito, e é aquilo em que tudo acaba, ele deu o primeiro passo da Humanidade na longa estrada do conhecimento filosófico e científico que é uma das características da atual civilização ocidental e que já se estendeu para o planeta Terra inteiro.