Recebi,
há muitos dias, remetida pelo bem informado colega Lago Neto, comunicação, feita
pela Presidente da FAABB, nossa dinâmica, devotada e esclarecida líder, Dª Isa
Musa, do recebimento, por cópia, de duas minutas de Resoluções da Comissão Interministerial
de Governança Corporativa e de Administração de Participações Societárias da
União – CGPAR, oriundas de uma reunião realizada em 11 de julho do corrente
ano.
O
princípio básico que deve orientar uma reunião para discutir a redação de uma
instrução governamental é o seguinte: a instrução submete-se à Constituição
Federal e às leis do Brasil.
Isso, porque “Todos são iguais
perante a lei, sem distinção de qualquer natureza” (artigo 5º da CF) e “ninguém
será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”
(inciso II do artigo 5º da CF). O cidadão brasileiro não tem ninguém acima
dele, nem burocratas do Governo, nem Governador, nem Ministro, nem Presidente
da República, nem mesmo Juiz. Acima do cidadão brasileiro só existe a lei. O
cidadão brasileiro só se submete à lei, só é inferior à lei. Todas essas
autoridades somente são obedecidas enquanto incorporarem a lei. O cidadão
brasileiro somente obedece à lei que as autoridades políticas expressam.
Ora, qual é a parte da Constituição Federal que trata da Saúde do
cidadão brasileiro? É o Título VIII Da Ordem Social. Esse Título VIII Da Ordem
Social resume o motivo, a razão de ser do Estado Brasileiro, do país Brasil.
Todo esse organismo existe para que se realize a ORDEM SOCIAL. E o que é, em
que consiste essa ordem social? A resposta é o capítulo I desse Título VIII, o
mais curto artigo, o artigo que é um capítulo da Constituição Brasileira, o
único artigo que é um capítulo da Constituição Brasileira, de tão importante
que ele é, o de máximo valor porque sintetiza a finalidade do Estado brasileiro
e o meio de realiza-la: “Art. 193. A ordem social tem como base o primado do
trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais.” Isto é, o Estado
Brasileiro foi criado pelos brasileiros para isto: o bem-estar de todos os brasileiros
na medida exata de sua operosidade; e o Estado proporciona o ambiente adequado
e eficiente para isso, empregando a riqueza produzida pelo trabalho de cada
brasileiro.
Maria Helena Diniz explica no Dicionário Jurídico Universitário que
ordem social, no direito constitucional, é o conjunto de normas que estabelece
a base da sociedade e da estabilidade das relações sociais. Claro, uma
sociedade democrática e não autoritária, uma sociedade do consenso e não da
força, tem que estabelecer as bases de relacionamentos entre os participantes e
da permanência desses relacionamentos através do consenso, que se alcança
mediante a racionalidade e o altruísmo. Esse consenso é a lei.
A lei existe para hoje e para amanhã, para o presente e para o futuro. A
lei é segurança contra a incerteza do amanhã, contra os azares da vida. A lei é
estabilidade, enquanto a vida é futuro, é desconhecimento, é incerteza. A lei é
o alicerce dos planos de vida individual. Ela é que fornece a estabilidade
necessária para se construir o homem que se quer ser e em que consistirá o
bem-estar de cada brasileiro. A lei é a estabilidade do presente infiltrando-se
na instabilidade do futuro. E o valor dessa segurança da lei avulta de forma
preponderante no ordenamento jurídico da ordem social, quando trata da
subsistência e da saúde, e tanto que lhes empresta a denominação global de
seguridade social e a subdivide em três seções, a da saúde, a da previdência
social e a da assistência social.
O Estado brasileiro foi criado, a população brasileira naquele ano de
1988, decidiu criar o Estado Brasil para dar segurança de subsistência e saúde
a todos os cidadãos brasileiros. E o artigo 193 diz no que essa garantia se
acha baseada: no primado do trabalho. Creio que esse artigo pressupõe aquele
princípio econômico de que a riqueza de uma nação tem sua origem na terra, no
capital e no trabalho. Creio que esse artigo entende que máquinas e terra
produzem sob a atuação humana e, portanto, o fator trabalho é o fator decisivo.
Creio que esse artigo proclama, aos quatro ventos, que a riqueza do Brasil não
provém fundamentalmente do capital, mas, isso sim, da operosidade de seu povo. A Constituição brasileira, em diversos
artigos, diferencia trabalho e livre iniciativa, o trabalho autônomo do
trabalho contratado. Acredito que neste artigo se deva entender de forma
abrangente o vocábulo trabalho. Entendo que a ordem social tem como base a
operosidade do cidadão brasileiro: o bem-estar do povo brasileiro é função da
operosidade do cidadão brasileiro e cada cidadão brasileiro merece o bem-estar
que sua operosidade lhe proporciona. A sobrevivência de cada cidadão brasileiro
é resultado de seu trabalho. Cada cidadão brasileiro é responsável pela sua
sobrevivência e, através de seu trabalho, deve contribuir para o bem-estar do
povo brasileiro, cada cidadão dele participando na justa medida de sua
contribuição. Mais, cada cidadão brasileiro, mesmo que herde fabulosa fortuna e
não precise trabalhar, tem o dever de contribuir, na medida justa de sua
fortuna herdada, para o bem-estar da comunidade, simplesmente porque, em grande
parte, a sua herança é construção da sociedade: “Eu sou eu e minhas
circunstâncias.”, princípio de Ortega y Gasset, assumido pela cultura hodierna
como explicação do indivíduo e da sociedade. E por isso essa realidade
existencial tornou-se norma constitucional e norma existencial de todo cidadão
brasileiro. Ninguém pode alegar que a desconhece. Ela nos rege. Ela nos
submete. Só a ela nos submetemos. A vida de cada brasileiro é fundamentalmente
construída sob a forma dessa norma constitucional, o artigo 193 da Constituição
Federal.
Temos, assim, que assumir:
1º Todo brasileiro hígido tem o dever de trabalhar.
2º O Estado tem obrigação de proporcionar segurança de subsistência e
saúde a todo cidadão brasileiro incapacitado de trabalhar, por doença, acidente
ou idade, bem como aos dependentes destes.
A expectativa de vida do cidadão brasileiro, no ano passado, segundo o
IBGE, era de 75,6 anos. Está correto que um cidadão brasileiro hígido se
aposente (passe a ser sustentado pela sociedade) aos 50 anos de idade e 30 de
trabalho?
O artigo 195 do texto original da Constituição de 1988 fixava em 65 anos
a idade mínima de aposentadoria para homens e 60 para mulheres, quando a
expectativa de vida no Brasil já era de 65,6 anos. Essa prescrição foi
eliminada, dez anos depois, pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998, no
Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, do Partido da (imaginem só!)
SOCIAL DEMOCRACIA Brasileira, quando a
expectativa de vida do brasileiro já subira para 69,11 anos. Dá para se
entender isso? Essa emenda está coerente com o artigo 193 – norma
constitucional fundamental da Ordem Social – no Estado da Social Democracia
Brasileira?
O Governo não adota nenhuma ação política de controle da natalidade,
muito ao contrário, estimula-lhe o incremento; nem tampouco adota ampla
política de formação profissional da população. Pode ele admitir que as
instituições e as empresas estatais adotem política de substituição da mão de
obra pela máquina? Pode estimular a adoção de tal política pelas empresas
privadas?
Os dois artigos da Previdência Social, o 201 e 0 202, eram bem
diferentes dos artigos atuais. Entendo que eles pretendiam, de fato, adotar o
que já fora construído pela sociedade na década de 70 do século passado,
descrente, ante o histórico da seguridade social brasileira, na lealdade
estatal na assunção de seus compromissos previdenciários e de saúde: uma previdência
básica, geral, diretamente custeada pelo governo, e, outra, particular,
complementar, custeada pelo cidadão.
A meu ver, isso é uma falácia, e, por isso, um retrocesso. Em primeiro
lugar, como se viu previdência e saúde são segurança existencial. A previsão
hoje de existência de uma empresa brasileira é de cinco anos. Nem as empresas
estatais oferecem expectativa de existência de meio século... O Banco do
Brasil, por exemplo, em duzentos anos de existência, hoje é o terceiro que já
existiu. O primeiro, criado por D. João VI em 1808, foi liquidado em 1833,
arruinado por dívidas. Recriado em 1851, o segundo Banco do Brasil, pelo Barão
de Mauá, um banco privado, em 1853, transcorridos apenas dois anos, o Visconde
de Itaboraí, transformou-o, no Banco da República do Brasil, banco do governo,
o terceiro Banco do Brasil, o atual, que perdeu o nome república em 1905.
Nestes últimos cento e doze anos, ele passou por muitas e até profundas
modificações tais, que não se pode afirmar que é o mesmo banco, senão por
motivo da participação majoritária do Estado no seu capital: exerceu funções de
banco central, de banco de desenvolvimento, de banco de colonização, de banco
rural, sendo hoje mero banco comercial. As
empresas podem efetivamente assegurar
segurança existencial ao cidadão?
O caput do artigo 202, Emenda Constitucional 20, de 1998, governo do
Partido da DEMOCRACIA SOCIAL Brasileira, com efeito desonera o Estado da
responsabilidade pela
previdência complementar transferindo-a totalmente totalmente para o arbítrio do cidadão e a garantia
de meras reservas de instituições privadas, que podem assumir variadas formas,
muitas delas claramente incompatíveis com a natureza de segurança existencial! Pode alguma empresa privada proporcionar garantia
existencial a alguém? Grande número de
cidadãos abastados não se defrontam ao longo da vida, sobretudo nos últimos
dias de existência, com problemas de subsistência? Um cidadão, por mais rico
que seja, não deve, pelo menos, em razão mesmo de sua riqueza, colaborar para a
integral segurança previdenciária do conjunto dos cidadãos? Não foi essa
sociedade de cidadãos que lhe proporcionou as condições para acumular fortuna?
Ele está alheio a essa obrigação SOCIAL da previdência?
Particularidade que me estarrece nessa Emenda Constitucional 20, de
1998, promulgada no governo do Partido da DEMOCRACIA SOCIAL Brasileira é o “§
2º do artigo 202: “As contribuições do empregador, os benefícios e as condições
contratuais previstas nos estatutos, regulamentos e planos de benefícios das
entidades de previdência privada não integram o contrato de trabalho dos
participantes, assim como, à exceção dos benefícios concedidos, não integram a
remuneração dos participantes, nos termos da lei.”
Atentem bem. Aquele trabalho, de que trata o artigo BÁSICO do Título
VIII Da Ordem Social da Constituição Brasileira, como afirmei anteriormente,
entendo abarcar tanto o emprego como a livre iniciativa, embora foque sobretudo
o emprego, como atestam os artigos 201 e 202 nesse inciso II. Logo, há uma previdência
relacionada com o emprego. A contribuição do empregado é retirada do seu
salário (“remuneração paga pelo empregador ao empregado, como contraprestação
do serviço que lhe prestou”, consoante Dicionário Jurídico Universitário). Prestação,
diz Aurélio, é o ato pelo qual alguém cumpre a obrigação que lhe cabe na forma
estipulada no contrato. O cidadão somente é participante do plano de benefícios,
porque é empregado da empresa. O empregador somente criou esse plano para os
seus empregados. Não existe outro motivo para a existência do plano de
benefícios, senão o emprego. Como esse plano não é uma contraprestação ao
trabalho do empregado? Contraprestação adicional, facultativa, condicionada, mas
é parte da contraprestação, desde que livre e soberanamente contratada pelo
empregador, no meu entender. E, se o plano de benefícios é parte da
contraprestação do empregador, isto é, do salário, como esses integrantes dele
– as contribuições do empregador, os benefícios e as condições contratuais
previstas nos estatutos, regulamentos e planos de benefícios das entidades de
previdência privada – podem não ser? É inegável a presença do vínculo
empregatício, no caso dos planos de benefícios previdenciários para empregados
de empresas, ou não? Pode uma norma jurídica castrar um fato jurídico? Ou a
norma jurídica nasce do fato jurídico? A ele se superpõe? A norma jurídica é ou
não é nada mais que uma relação de direito e de obrigação, gerada por um fato
ocorrido na vida real?
Com relação à saúde atente-se para o que dizia o texto original da
Constituição Federal no artigo Art. 196: “A saúde é direito de todos e DEVER
DO ESTADO, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à
redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e
igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.”
Esse artigo nunca foi alterado. Permanece o texto original.
Nós
funcionários do Banco do Brasil gozamos desse direito, na minha opinião, por
contrato de trabalho, coagidos que somos de ingressar na CASSI no mesmo dia em
que ingressamos no Banco do Brasil, consoante se acha declarado no próprio
estatuto da CASSI artigo “6º-
§ 1º - O ingresso dos associados no Plano de Associados da CASSI vigerá, AUTOMATICAMENTE, A PARTIR DA DATA DE INÍCIO DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO COM O BANCO DO BRASIL S.A.” Ele, como acabamos de ver, é muito mais que isso: É DIREITO CONSTITUCIONAL, EXPRESSAMENTE GARANTIDO PELO PRÓPRIO ESTADO BRASILEIRO. Como se pode ameaçar de retirá-lo? Como se podem rever condições contratuais, impondo custos incompatíveis com o próprio salário que é pago pelo empregador e por ele fixado? Essa ameaça não constitui clara afronta ao mandamento constitucional?!
§ 1º - O ingresso dos associados no Plano de Associados da CASSI vigerá, AUTOMATICAMENTE, A PARTIR DA DATA DE INÍCIO DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO COM O BANCO DO BRASIL S.A.” Ele, como acabamos de ver, é muito mais que isso: É DIREITO CONSTITUCIONAL, EXPRESSAMENTE GARANTIDO PELO PRÓPRIO ESTADO BRASILEIRO. Como se pode ameaçar de retirá-lo? Como se podem rever condições contratuais, impondo custos incompatíveis com o próprio salário que é pago pelo empregador e por ele fixado? Essa ameaça não constitui clara afronta ao mandamento constitucional?!
(continua)
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